Desenvolvimentismo e nação

O petróleo é nosso

Comício na Cinelândia durante a campanha  nacionalista "O Petróleo é Nosso", Rio de Janeiro, 24 de junho de 1957. Agência O Globo

Santo André, 15 de maio de 1948. No Cine Teatro Carlos Gomes, reuniam-se lideranças políticas locais, entre as quais vereadores e sindicalistas, para a Conferência pela Defesa do Petróleo. Nacionalistas, comunistas, trabalhistas, progressistas, liberais e conservadores articulavam-se em torno da defesa das reservas petrolíferas do Brasil. Nos meses seguintes, foram criados Centros de Defesa do Petróleo em Santo André e São Caetano. Comícios eram realizados quase diariamente em várias cidades do país,  difundindo a campanha “O petróleo é nosso” (1948-1953). Essa movimentação em torno das reservas de petróleo brasileiras pode ser vista como um prenúncio do projeto de desenvolvimento nacionalista que daria a tônica dos anos seguintes.

As grandes greves

Greve dos 300 mil: trabalhadores se reúnem e fazem manifestação na Avenida São João, próximo ao edifício Martinelli, no centro da cidade de São Paulo, 1953. Arquivo/Estadão Conteúdo/AE​

Nos anos 1940 e 1950, políticas desenvolvimentistas que incentivavam a produção industrial se alastraram pelo Brasil. O número de trabalhadores nas cidades aumentou expressivamente – e também as mobilizações por melhores condições de trabalho. Assim, o período em que se instituiu o ideário nacionalista de desenvolvimento foi marcado, contraditoriamente, por numerosas mobilizações sociais.

Greve dos 400 mil - Operários têxteis em greve em São Paulo, outubro de 1957. Acervo Iconographia

Foi neste contexto, que, em março de 1953, a cidade de São Paulo se tornou palco da Greve dos 300 mil. Iniciada em fábricas têxteis do Brás e da Mooca, a greve foi motivada pela desvalorização salarial. Com adesão de várias categorias – como  metalúrgicos, marceneiros e vidreiros –, durou quase um mês e teve desfecho vitorioso. Muitos outros movimentos marcaram o ano de 1953 que, por isso, teve grande importância para a articulação da classe trabalhadora no Brasil. Em 1954 foi criado o Pacto de Unidade Intersindical (PUI) e, em 1955, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE). Ambos foram essenciais para a realização da Greve dos 400 mil, no ano de 1957.

Estima-se que, entre 1956 e 1964, tenham ocorrido 588 greves de trabalhadores em todo o país. Contudo, o aparato policial montado contra elas e a repressão violenta aos manifestantes revelaram que a prosperidade desenvolvimentista não era para todos.

A crise da Era Vargas

Enquanto as greves se multiplicavam, uma crise se instalava no governo. Getúlio Vargas, que fora eleito presidente, desta vez por meio do voto direto, via-se obrigado, em seu segundo governo (1951-1954), a navegar pelas ondas turbulentas da democracia. A crise inflacionária e a alta do custo de vida levaram o presidente a tomar medidas populares, como o aumento de 100% do salário mínimo, e outras de caráter nacionalizante, como o controle da remessa de lucros para o exterior e o monopólio estatal sobre as reservas petrolíferas nacionais, que levou à criação da Petrobrás, em 1953.

Tais medidas desagradavam os setores políticos e econômicos identificados com uma linha econômica mais liberal, assim como aumentavam as pressões norte-americanas sobre o governo brasileiro, em uma conjuntura marcada pela Guerra Fria. A ferocidade dos opositores de Vargas, somada às denúncias de uso indevido de recursos públicos e a uma intensa campanha jornalística contra o seu governo levaram-no a uma atitude extrema: tirou a própria vida em 24 de agosto de 1954.

O desenvolvimentismo

A comoção nacional em torno do suicídio de Vargas e a repercussão da sua carta-testamento possibilitaram a articulação de diferentes correntes políticas: umas em torno de bandeiras nacionalistas e desenvolvimentistas e outras ligadas a grupos internacionais que desejavam aumentar a sua influência no Brasil. A herança política deixada pelo ex-dirigente foi largamente disputada. Um dos fiadores desta herança, o mineiro Juscelino Kubitscheck, foi eleito presidente em 1955. João Goulart, expoente do trabalhismo brasileiro, elegeu-se o seu vice com uma votação expressiva.

Por meio do Plano de Metas, Kubitschek objetivava acelerar o desenvolvimento do Brasil, ampliando o parque industrial com a instalação de multinacionais em território brasileiro, tais como a Mercedes-Benz e a Volkswagen, inauguradas em São Bernardo do Campo, em 1956 e 1959, respectivamente. Em meados dos anos 1950, enquanto a bossa nova dedilhava os seus primeiros acordes e uma nova capital era construída no coração do Brasil, eletrodomésticos modernos chegavam às lojas e o último modelo de automóvel ganhava as ruas. O clima de prosperidade era evidente, mas não era para todos. Para muitos brasileiros, o custo de vida atingia níveis alarmantes.

Autor do texto original do projeto:

Paulo Fontes