As olarias constituem uma das mais antigas indústrias da história da humanidade. Apesar das inovações tecnológicas, as etapas de fabricação do tijolo, desde a Antiguidade, continuam as mesmas: armazenamento do barro extraído das barreiras, preparação da pasta, moldagem, secagem e queima.

Nos três primeiros séculos da história paulista, o sistema construtivo predominante era a taipa de pilão, tendo a terra e a madeira como matérias-primas e os escravos como mão-de-obra. Fora das cidades, o emprego de tijolos se iniciou nos terreiros de café, o que explica a presença de olarias, inicialmente, nas fazendas.

No ABC, a atividade oleira remonta ao tempo dos frades beneditinos na região, em meados do século XVII. Os beneditinos tinham sua olaria na fazenda de São Caetano, em terreno doado à ordem, em 1631, dando origem posteriormente à cidade de mesmo nome. Em 1876, o governo imperial adquiriu as terras dos beneditinos, para ali implantar uma colônia de italianos. Eram 26 famílias, que se instalaram provisoriamente na casa da fazenda. Com o decorrer dos anos, os oleiros, que apenas fabricavam telhas, começaram a fabricar também tijolos.
Impulsionada pela presença e expertise dos imigrantes e pela excelência da argila local, a produção de tijolos foi um fator importante nas origens das atividades industriais do ABC Paulista. Na capital paulista, o tijolo já era utilizado de forma sistemática na década de 1850, aproveitando a argila da várzea do rio Tietê.

O trabalho nas olarias era sujeito às intempéries da natureza, sendo muitas vezes interrompido em épocas de chuva, quando os espaços de trabalho eram invadidos pelas águas, uma vez que ficavam situados perto de várzeas. Ainda assim, um número crescente de colonos encontrava na olaria um meio de subsistência alternativo à agricultura, que oferecia ainda mais adversidades.
As olarias eram identificadas, geralmente, pelos nomes de seus proprietários. Isso porque a produção, por muito tempo, esteve fundamentada na exploração de mão-de-obra familiar e não qualificada.

O declínio da atividade oleira desta primeira fase se deu à medida que novas tecnologias de produção de tijolos e blocos passaram a demandar menos de mão-de-obra humana, e devido ao uso crescente de cimento e concreto na construção. A crise política que assolou São Paulo na década de 1930 também fez com que pessoas que tinham se dedicado à prática oleira se dirigissem a outros ramos, como a construção civil.
Houve, entretanto, exceções, como o sr. Olice Raíza que, na década de 1950, adquiriu uma olaria mediante empréstimo bancário e, anos depois, tornou-se conhecido como “o rei do tijolo”, por produzir mais de um milhão de unidades mensais. Os tijolos Raíza ajudaram a erguer edifícios emblemáticos como o Estádio do Pacaembu, em São Paulo, o conjunto IAPI, em Santo André, e foram mesmo enviados para a construção da nova capital, Brasília.

Depoimento 1 (desenvolvimento do ramo oleiro)

“Em 1934 meu pai teve fábrica de tijolos refratários. Tinha maquinário sim. O mais importante era a pedra para moer argila. No começo era um moinho puxado a burro que a misturava, depois veio o motor elétrico”.― Verino Ferrari (FERES, 1998: p. 187)
 

Depoimento 2 (trabalho de menores)

“Agora muitos daqueles que tinham olarias aqui em baixo, no Bairro da Fundação, tiravam suas filhas da escola quando completavam o segundo ano, sabe por quê? Para irem lançar tijolos! Estudaram pouco elas( ... ) Era costume os filhos trabalharem todos com os pais nas olarias das famílias( ...)”.― Joanna Fiorotti (FERES, 1998: p. 178)

 

Depoimento 3 (o transporte da argila, do lombo de burro ao trem)

“Já o meu pai Francisco Garbelotto era um menino bem forte. Ele trabalhava na olaria também, porém o seu serviço já não era tão duro quanto o do meu avô e da minha avó. Ele trabalhava mais na busca de matéria prima: pegava uma carrocinha com os burros e ia descarregar o barro dos vagões da São Paulo Railway.”― Adazir Garbelotto (FERES, 1998: 244)

 

Depoimento 4 (decadência do ramo oleiro)

“Em 1932 meu pai tinha olaria na Vila Alpina e por causa da Revolução não conseguia vender tijolos, era tempo de crise (...) Mas continuou fabricando-os na esperança de melhorar. Foi fabricando, fabricando... Chegou a ter mais de quinhentos mil tijolos estocados! (...) Uma parte dos tijolos que ele estocava trocava com um armazém de secos e molhados que existia no fim da Ibitirama, era de um húngaro. Em vez de ele dar dinheiro para o meu pai, em troca de tijolos dava farinha, azeite, batata, cebolas, salames, mortadelas...“.― Geraldo Braido (FERES, 1998: 229)

 

Modo de fazer: modelando o barro

O tijolo é feito a partir da argila queimada, o que requer um forno para a queima e formas para dar-lhe um formato padrão. As etapas de seu fabrico são basicamente estas:

1) retirada da argila (matéria-bruta) para a preparação da pasta, o que exige o transporte da mesma até as olarias. Tais tarefas são executadas pelo “caçambeiro”, cujo trabalho começa ainda de madrugada. Ele ganha por quantidade de barro extraído;
2) mistura do barro com terra seca e água para a preparação da pasta. A pessoa que realiza esta tarefa é designada “pipeiro”, isto porque a mistura é colocada numa pipa para ser amassada por pás puxadas à tração animal;
3) colocação do barro em formas, pelo tijoleiro ou banqueiro, a fim de moldá-los.
4) secagem das peças moldadas, por alguns dias, em local seco;
5) enfornamento dos tijolos para cozimento. Após resfriados, necessitam ser desenformados. Esta tarefa é feita por (todos os) oleiros, o que requer conhecimentos determinados para que a produção não seja estragada.

“Chamava-se pipa o lugar onde punham o barro para ser mexido. Tinha um eixo e cavalos que andavam em volta para mexer o barro. Mexia até chegar num determinado ponto. Aí punha-se aquele barro numa forma – uma caixinha com o logotipo da olaria em relevo – socava-se bem, passava-se um arame em cima e deixava-se o tijolo de lado. Depois o lançador de tijolos os desenformava – chamava-se este ato de lançar tijolos – e estes ficavam com a marca do fabricante em alto relevo“.― (FERES: 1998; p. 217)