As três primeiras décadas do século XX foram marcadas pela formação da indústria moveleira no ABC. As empresas eram familiares, com produção predominantemente manual, e a divisão do trabalho não era uma prática corrente. Muitas das fábricas começaram em cômodos improvisados, nas casas dos trabalhadores e trabalhadoras.

As indústrias moveleiras de São Bernardo geraram uma quantidade de empregos até então inigualável e transformaram a economia da cidade ao longo do século XX, tornando-a conhecida nacionalmente como a “capital do móvel” – antes de ser a “capital do automóvel”.

A fábrica de móveis foi uma verdadeira escola: formou gerações de jovens interessados em trocar o campo pela cidade. Quando a Rádio Independência iniciava suas transmissões diárias, entre 6h e 7h, uma fila de violeiros vindos do interior congestionava a entrada da emissora. Após as apresentações, seguiam para o trabalho nas oficinas de móveis. Ingressavam como aprendizes e viravam trabalhadores especializados. Alguns deles acabavam fundando novas fábricas.

Os trabalhadores não usavam uniformes, mas costumavam trajar calças de brim, camisas escuras de chita, alpargatas e tamancos. Os especializados e melhor remunerados – marceneiros, folheadores e entalhadores – tinham suas próprias ferramentas, guardadas em caixas de madeira fabricadas por eles próprios.

Apesar do predomínio da força de trabalho masculina, para tarefas específicas também eram empregadas mulheres e crianças, que cumpriam jornadas de mais de 9 horas por dia. Nesse cenário, surgiu uma nova consciência trabalhista: um dos primeiros sindicato de trabalhadores, na Era Vargas, foi o Sindicato dos Trabalhadores da área moveleira, criado em 1933. No ano seguinte à criação do sindicato, uma greve parou as fábricas por semanas e culminou em negociações que permitiram a criação de cooperativas de trabalhadores.

Durante os anos 1960 e 1970, deu-se o apogeu do setor moveleiro de São Bernardo, que chegou a ter mais de 160 fábricas. Mas, ao longo da década de 70, não ocorreu renovação da força de trabalho, pois os jovens foram sendo absorvidos pela indústria automobilística. Ao mesmo tempo, a região Sul do país fez grandes investimentos em maquinário, automatizou sua linha de produção e se transformou numa das principais produtoras do setor.

Hoje, São Bernardo ainda é famosa pelos seus móveis, mas como intermediária: lá são vendidos produtos trazidos de outros pontos do Brasil, com destaque para as cidades da serra gaúcha. Mesmo assim, sobrevivem marcenarias em todos os pontos da cidade, geralmente para atender demandas locais.

“Durante a greve (de 1934), os operários usaram da tática de manter em funcionamento o trabalho nas pequenas empresas, paralisando-o nas maiores. Três grandes empresas chegaram a ser vendidas aos próprios operários, que passaram a ser patrões.”― (Mazzo, 1991)

 

Autores dos textos originais do projeto:

Vinicius de Rezende
Ademir Medici

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