Caminho da Ferrovia

O principal fator que bloqueava o crescimento e o desenvolvimento de São Paulo e de seus arredores era a dificuldade de acesso ao porto, por causa da imponente Serra do Mar. Os caminhos que ligavam o interior ao litoral eram percorridos por tropas de burros e mulas ou então a pé, com grandes riscos, devido ao declive e à umidade.

A implementação da São Paulo Railway, na segunda metade do século XIX, fortaleceu a centralidade da cidade de São Paulo. A primeira estrada de ferro paulista ligava Santos a Jundiaí, permitindo que o café produzido no planalto fosse escoado e exportado a partir do Porto de Santos. Visava principalmente ao transporte de carga, com pouca estrutura para passageiros.

Para além do desafio tecnológico de transpor uma serra íngreme com um sistema funicular, a ousada e custosa obra de engenharia inglesa trouxe ao Brasil um sistema de trabalho resultante da Revolução industrial que, adaptado à mão-de-obra local (escravos e imigrantes), estabeleceu uma hierarquia social bem demarcada entre os trabalhadores envolvidos nas obras.

A fim de driblar os desníveis no terreno, tuneis foram escavados nas montanhas e viadutos construídos sobre os vales. O trabalho foi feito apenas com marretas e picaretas, sem explosivos nem máquinas. Não causa espanto que tenha durado vários anos.

Os operários residiam em casas ao longo da ferrovia. E, aos poucos, foram se formando núcleos urbanos ao redor das estações e galpões. O início da colonização do atual município de Santo André se deu em torno da parada do trem. Localizada num local inicialmente ermo, a estação se chamava São Bernardo, por ficar próxima à Freguesia de São Bernardo, mas, na verdade, pertencia à Vila de Santo André.

 

Depoimento

Nas suas crônicas, Eliziário Firmo de Lima, o Zizá de Santo André (1910-1995), conta memórias dos trens para São Paulo:

“Em 1917/18, aproximadamente, os trens para São Paulo eram escassos. Lembra-me bem o subúrbio das 14h30. Eram composições pequenas, geralmente de três vagões. O percurso era Santo André, São Caetano, Ipiranga, Brás e Luz. Para evitar acidentes, cada vagão era trancado a chave pelo guarda-trens, impecável em seu uniforme azul-marinho, quepe e gravata, e cujas portas se abriam em cada parada.

Junto à Estação de Santo André, aguardando os passageiros, ficavam dois coches, atrelados a dois cavalos cada.

Os seus cocheiros eram Adelelmo Setti e o velho Giácomo, residentes na Vila de São Bernardo, que faziam o percurso entre Santo André e aquela cidade. Não havia outra condução para São Paulo. Posteriormente apareceu outro coche do Sr. Ismael Lobo.

No Brás o comércio era bastante desenvolvido. Boa parte das pessoas de Santo André e São Caetano fazia lá determinadas compras: calçados na Casa Clark, remédios na Drogaria Baruel, frutas estrangeiras no Café Portuense.

No Largo da Concórdia, a um quarteirão da estação do Brás, existia o famoso Teatro Colombo, prédio muito bonito que recebia companhias líricas italianas. Estas companhias, depois de se exibirem no Teatro Municipal, no Centro, na despedida homenageavam a vasta colônia italiana do Brás, apresentando-se no Teatro Colombo a preços populares. Italianos de Santo André e São Caetano faziam-se presentes.

Anchor Falando ainda de trens para São Paulo quero assinalar que Santo André, por volta de 1940, tinha o expresso que vinha de Santos com uma só parada, no Brás. Fazia então o percurso direto, de Santo André ao Brás, em 16 minutos. A estação terminal era a da Luz.
O expresso era velocíssimo e suas caldeiras eram acionadas com carvão mineral de Cardiff, Inglaterra.”

Crônicas de Eliziário Firmo de Lima, publicada por Ademir Medici no artigo “Hoje tem companhia lírica no Teatro Colombo“, na revista eletrônica Diário do Grande ABC, em 22.06.2010. Disponível em: http://www.dgabc.com.br/noticia/288010/hoje-tem-companhia-lirica-no-teatro-colombo Acesso em 15.12.2016.